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Síndrome de Asperger para PEA


Escrito por Francisca de Castro Palha

No DSM-IV (1), bem como no CID-10 (2), o diagnóstico de Autismo incluía, genericamente, três grupos de manifestações, a saber: dificuldades na reciprocidade e interacção social; dificuldades na linguagem; e comportamentos repetitivos, estereotipados e restritos. Nos mesmos sistemas classificativos, a síndrome de Asperger, em homenagem ao insigne pediatra austríaco Hans Asperger, apresentava, como critérios de inclusão, tão-somente e grosso modo, dificuldades na reciprocidade e interacção social associadas a comportamentos repetitivos, estereotipados e restritos, devendo ser convencionais a linguagem e a cognição; ou seja, por outras palavras, estas funções neurodesenvolvimentais teriam de estar essencialmente preservadas.

Com o DSM-5 (3), o diagnóstico de síndrome de Asperger é extinto e a nova entidade proposta neste domínio nosológico toma a designação de Perturbação do Espectro do Autismo; e herda, basicamente, os critérios de inclusão, ou seja, classificativos, da síndrome de Asperger. Se forem detectados défices na área da linguagem, sem atingimento da cognição não-verbal, deverão ser formulados os diagnósticos, em co-morbilidade, de Perturbação da Linguagem e de Perturbação do Espectro do Autismo; se forem detectados défices na área da linguagem e na área da cognição, deverão ser formulados os diagnósticos, em co-morbilidade, de Perturbação de Desenvolvimento Intelectual e de Perturbação do Espectro do Autismo ou ainda, o que não é tão raro, de Perturbação de Desenvolvimento Intelectual, de Perturbação da Linguagem e de Perturbação do Espectro do Autismo, caso a linguagem apresente um défice desproporcionalmente significativo (superior a 20%) relativamente à cognição não-verbal.

Idêntico entendimento, este de extinguir a síndrome de Asperger, parece ser o da comissão de peritos da OMS, que, na versão Beta draft do CID-11, a publicar em 2018, e actualmente em consulta pública no sítio electrónico da Organização Mundial de Saúde, propõe, no momento presente, no âmbito das Perturbações do Espectro do Autismo, as seguintes sub-categorias nosológicas:

  1. Perturbação do Espectro do Autismo sem Perturbação do Desenvolvimento Intelectual e sem défice ou com ligeiro défice da linguagem funcional;

  2. Perturbação do Espectro do Autismo com Perturbação do Desenvolvimento Intelectual e sem défice ou com ligeiro défice da linguagem funcional;

  3. Perturbação do Espectro do Autismo sem Perturbação do Desenvolvimento Intelectual e com défice da linguagem funcional;

  4. Perturbação do Espectro do Autismo com Perturbação do Desenvolvimento Intelectual e com défice da linguagem funcional;

  5. Perturbação do Espectro do Autismo sem Perturbação do Desenvolvimento Intelectual e com ausência de linguagem funcional;

  6. Perturbação do Espectro do Autismo com Perturbação do Desenvolvimento Intelectual e com ausência de linguagem funcional;

A sub-categoria 1 corresponde à extinta síndrome de Asperger (CID-10 e DSM-IV) e à actual Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5).

A sub-categoria 2 corresponde à co-morbilidade de Perturbação do Desenvolvimento Intelectual e de Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5);

A sub-categoria 3 corresponde à co-morbilidade de Perturbação da Linguagem e de Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5);

A sub-categoria 4 corresponde à co-morbilidade de Perturbação do Desenvolvimento Intelectual e de Perturbação do Espectro do Autismo, ou, se o défice linguístico for desproporcionalmente significativo relativamente à cognição não-verbal, a uma co-morbilidade de Perturbação do Desenvolvimento Intelectual, de Perturbação da Linguagem e de Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5);

A sub-categoria 5 corresponde à co-morbilidade de grave Perturbação da Linguagem e de Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5);

A sub-categoria 6 corresponde à co-morbilidade de Perturbação do Desenvolvimento Intelectual e de Perturbação do Espectro do Autismo, ou, se o défice linguístico for desproporcionalmente significativo relativamente à cognição não-verbal, a uma co-morbilidade de Perturbação do Desenvolvimento Intelectual, de grave Perturbação da Linguagem e de Perturbação do Espectro do Autismo (DSM-5).

Esta sub-categorização é, na sua essência, clinicamente compatível e comparável aos graus de gravidade das Perturbações do Espectro do Autismo propostos no DSM-5; mas, independentemente de ser, ou não, exequível formular os diagnósticos de algumas das sub-categorias (por exemplo, a sub-categoria 5, a existir, será absolutamente excepcional, dada a quase inevitabilidade de contaminação da cognição não-verbal pelo défice linguístico), esta concepção representa um grande avanço epistemológico, com consequências assaz benéficas em matéria de investigação e da clínica neurodesenvolvimental.

Em suma:

  1. A extinção do diagnóstico de síndrome de Asperger, quer no DSM-5, quer no futuro CID-11 (como resultado da análise dos elementos conhecidos no presente), constitui um inequívoco avanço epistemológico;

  2. A abordagem proposta provisoriamente no CID-11, sobretudo no que concerne à metodologia de sub-categorização das Perturbações do Espectro do Autismo, de um ponto de vista da clínica do neurodesenvolvimento e da teoria nosológica, faz todo o sentido, é de uma grande utilidade e é compatível com a epistemologia DSM-5.

Vejamos como irá evoluir o CID-11.

Bibliografia:

  1. American Psychiatric Association (1994), “Asperger’s disorder”, in DSM – IV, Lisboa: Climepsi Editores

  2. ICD-10 10th revision of the International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems (ICD), a medical classification list by the World Health Organization (WHO)

  3. American Psychiatric Association (2014) “Perturbações do Espectro do Autismo”, in DSM – 5, Lisboa: Climepsi Editores, páginas 91-100


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